
O livro, lançado no Brasil pela editora Intrínseca. (Divulgação/Edmund de Waal)
Mais livros, menos streaming: essa é uma das minhas resoluções para o ano novo. E posso dizer que comecei 2018 com o pé direito e toda de branco, muito bem acompanhada por O Caminho da Porcelana (Intrínseca, 69,90 reais), do escritor e ceramista britânico Edmund de Waal. O subtítulo do livro – A Jornada de uma Obsessão – explica em parte o desafio que o autor se propôs e encarou: visitar três lugares onde a porcelana foi inventada e reinventada – Jingzedhen, na China, Dresden, na Alemanha, e a Cornuália, na Inglaterra. Locais que ele chama de “meus três morros brancos”.

O ceramista e escritor Edmund de Waal. (Divulgação/Edmund de Waal)
Uma mistura equilibrada de caolim e petuntsé, dois minerais que precisam ser extraídos, refinados, misturados na proporção certa e queimados em alta temperatura, a porcelana nasceu na China, que, durante séculos, deteve o segredo da fabricação. Outras artes estavam envolvidas no processo (modelar, esmaltar, pintar) e, em tudo isso, os chineses saíram na frente. É só em 1706, em Dresden, nos domínios de Augusto II, o Forte, príncipe-eleitor da Saxônia, que a inusitada dupla formada por um matemático (Tschirnhaus) e um alquimista frustrado e lunático (Böttger) descobre a fórmula para produzir o “ouro branco”. Augusto, um colecionador obcecado por porcelana, que importava grandes lotes de vasos, potes, taças e pratos da China, havia aprisionado Böttger e colocado os dois para trabalharem juntos com esse objetivo. Em carta para um amigo, o imperador admite ter “a doença da porcelana” e que “é impossível se sentir saciado”. Ele sente um desejo sem fim de acumular objetos feitos do material. A febre contagiou outros monarcas da Europa. Edmund de Waal nos conta que a rainha Maria da Inglaterra contratou o arquiteto Daniel Marot, dono de um estilo maximalista, para criar “salas de porcelana” nos palácios de Hampton Court e Kensington. Ele espalhou potes por todos os lados. Será que nasceu aí a moda de pendurar pratos na parede?
O autor é ele mesmo um colecionador. Em sua jornada, recolhe cacos, compra potes, vasos e azulejos. Às vezes, pelo valor histórico das peças, às vezes, para analisar a composição, o jeito de modelar e o colorido. “Formar conjuntos é um jeito de controlar o mundo”, ele afirma. E também de lidar com a nossa finitude. Minimalista assumido, o escritor está em busca da brancura ideal.

Estante de potes brancos na mostra Atemwende, realizada na Gagosian Gallery de Nova York em 2013. (Divulgação/Edmund de Waal)
Em meio à narrativa histórica (resultado de uma extensa pesquisa) e de viajante, sempre escrita em parágrafos curtos, Edmund de Waal insere sua história pessoal como ceramista. Ele fala de seus primeiros utilitários, feitos com a pretensão de mudar a vida dos usuários, “não apenas fazer com que se sentissem bem ao despejar o leite de manhã ou ao pegar geleia do pote para passar na torrada, mas torná-los pessoas melhores”. Ele admite: sua produção dessa época não agradava ninguém e vendia pouco. Quando, pela primeira vez, moldou potes “sem ansiedade”, ou seja, sem a pressão de vender as peças ou de cair no gosto de um perfil imaginário de comprador, ele conseguiu vender a fornada inteira numa tacada só.
Um dia, na montagem de uma exposição numa pequena galeria de Londres, o ceramista criou prateleiras altas para colocar suas peças, como se elas estivessem num sótão inalcançável. Foi um turning point. “Agora eu fazia Instalações. Eu adejava com emoção perto da Arquitetura”.
E são algumas das instalações do autor que eu mostro nesta galeria de fotos. Se você, como eu ou Edmund de Waal, é um apaixonado por objetos e suas formas de expor, fica a sugestão para ler O Caminho da Porcelana. Ou seu livro anterior, A Lebre com Olhos de Âmbar, em que ele conta a história de sua família seguindo os rastros de uma pequena coleção de miniaturas japonesas.